sexta-feira, 9 de outubro de 2009

"Aqui, no se rinde nadie!"

Imagem aérea do bairro 23 de Enero

Nove de Outubro de 1973. Há seis anos, Ernesto 'Che' Guevara cuspia na cara do seu carrasco e gritava: "Dispara que vais matar um homem!". Mas os canos das metralhadoras do imperialismo não tiveram tempo de arrefecer. Há menos de um mês, o sangue de Salvador Allende arrastou consigo o sangue de milhares de chilenos. Calou-se a voz de Victor Jara e a pena de Pablo Neruda.

Um grupo de jovens decide, pela primeira vez, assinalar a morte de 'Che' Guevara. Fazem parte da J-23. Esta é a frente armada que opera no bairro 23 de Enero, zona subversiva de Caracas. Reúnem e tomam a decisão. Há que relembrar o guerrilheiro argentino através de uma acção espectacular. Esta noite, dos telhados de todos os blocos, serão lançados centenas de foguetes.

Um pequeno grupo comanda a operação. Serão eles a dar o sinal. Juan prepara o foguete e espera. É meia-noite. Pisca o olho aos camaradas e em vez de o lançar ao céu aponta-o à janela do apartamento do bufo. Com uma pontaria irrepreensível, o foguete entra na habitação e rebenta na sala. De imediato, centenas de explosões interrompem o silêncio nocturno. A esposa do bufo corre para a rua, aos gritos e em cuecas.

Nove de Outubro de 1979. Há seis anos que todo o 23 de Enero relembra a morte de 'Che Guevara'. Mas mais do que isso, a luta contra o capitalismo endureceu. No bairro, a J-23 deu lugar às Milícias Populares. Centenas de jovens da capital venezuelana aderem à guerrilha urbana. Há confrontos todas as semanas. A polícia e o exército ocupam os blocos e fazem buscas casa-a-casa. Há que exterminar toda a dissidência com a ditadura puntufijista. O assédio repressivo utiliza o assassinato e a tortura como ferramentas de intimidação.

Apesar das dificuldades, as Milícias Populares decidem organizar o tradicional lançamento de foguetes. Se a polícia e os militares ocupam os telhados, os guerrilheiros descem às ruas. Se a polícia e os militares ocupam as ruas, os guerrilheiros sobem aos telhados. Os jovens combatentes, apesar da inferioridade material, jogam em casa. Conhecem o bairro como as palmas das mãos e têm o apoio da população.

Mas esta noite vão alterar as regras do jogo. Não só subirão aos telhados, não só ocuparão as ruas, como também cercarão a esquadra dos torturadores. Põem os passa-montanhas. Empunham as pistolas e as pistolas-metralhadoras. Outros sobem aos telhados, outros guardam as esquinas. À mesma hora, ouve-se o sinal. Por todo o lado, explodem foguetes. Ouve-se bater tampas de panelas. Ao fundo, um megafone amplifica a voz de um combatente que lê um comunicado. E as rajadas assaltam, sem descanso, o módulo policial.

Nove de Setembro de 2009. Já não há módulo policial. Agora, no seu lugar, vive a Casa de Encuentro Freddy Parra. É ali que se encontra a rádio alternativa Al Son del 23. Também é ali que se ensina a população. Onde antes se torturava gente, há agora um info-centro onde se pode aceder à internet. Ao lado, um mercado que vende comida a preços sociais. Também muito perto, um centro de saúde onde duas médicas cubanas recebem a população. Já não há repressão. Quem vigia o bairro são os próprios habitantes que se organizam e mobilizam através de assembleias.

A Coordinadora Simón Bolívar, em conjunto com outros movimentos, decidiu realizar uma manifestação no bairro. Nela, não só se recorda 'Che' Guevara como se denuncia o imperialismo norte-americano e as sete bases que se vão concentrar na Colômbia. Centenas de pessoas percorrem o 23 de Enero reclamando o fim da interferência dos Estados Unidos na América Latina.

Durante a noite, juntaram-se nos telhados dos blocos do 23 de Enero. Uma vez mais, como em 1973, a noite de Caracas não se calou. Mas, desta vez, só houve a alegria de um povo que se levanta pelo futuro. Ninguém tapou o rosto. Ninguém fugiu das balas perdidas. Ninguém se escondeu.

6 comentários:

Bassoti disse...

Hasta Siempre Comandante!

Grande texto sobre estes corajosos camaradas.

Francisco disse...

Boa! :)

LGF Lizard disse...

Quem diria que o Che, um comunista, agora é um dos maiores vendedores de t-shirts, permitindo aos grande capital enriquecer à custa da malta de esquerda? Irónico.

rapariga do tejo disse...

Magnífica história contada por ti Camarada...

Estou mui emocionada, mas confiante no futuro e nos jovens destes países lutadores e atentos..

o nosso trabalho aqui é tão ou mais
difícil, mas a luta continua e a vitória será NOSSA!!!

Beijo fraterno e vermelho

rapariga do tejo disse...

LGF qualquer coisa.....

Também andas aqui....
estás atento....
e tu???

não tens um espaço assim como os nossos....

não, tu limitas te ao teu incompetente desdinhar...

Camarada desculpa mas este ser é uma melga mas não pica!eheheheh

Dimitrov disse...

Uma História exemplar de resistência popular!além do reflexo de uma revolução progressista que anuncia o futuro!

Parabéns pelo texto!

Saudações!